Desafios e dilemas de pais homossexuais
Se, para a maioria dos homossexuais, assumir uma identidade homossexual é quase sempre um enorme desafio, para aqueles que são pais o desafio torna-se ainda maior.
Minoria dentro de uma minoria, esses indivíduos vivem entre duas identidades conflitantes. Uma, vinculada à paternidade e muito valorizada socialmente, e outra, associada à natureza de sua sexualidade, com freqüência mantida em segredo.
O grande desafio enfrentado por essas pessoas, portanto, é integrar as duas identidades, reduzindo, assim, os conflitos entre os sentimentos homossexuais e o exercício da paternidade.
Para os psicólogos americanos R. Barret e B. Robinson, autores do livro Gay Fathers, essa integração habitualmente se faz por meio de um processo de cinco fases: pré-casamento, casamento, paternidade, separação e vida homossexual. Segundo eles, o sucesso ou o fracasso dessa integração em geral é resultado da maneira como cada uma dessas etapas foi vivenciada. Indivíduos com vida homossexual ativa antes e durante o casamento tendem a fazer a transição de forma menos conflituosa.
A etapa da separação é a que costuma causar maior ansiedade, já que, por si só, toda separação, independentemente da questão da homossexualidade, é traumática para a maioria das famílias. Nessa fase, é comum a ocorrência de sentimentos muito intensos, que vão do alívio à culpa, da excitação à depressão. Por outro lado, também se verifica uma elevação da auto-estima e a interrupção de sintomas psicossomáticos, tais como dores de cabeça, problemas gastrointestinais, fadiga crônica.
Já o grande dilema que se apresenta a muitos pais homossexuais é o de assumir-se ou não para os filhos.
São muitos os medos e as fantasias associados à descoberta da homossexualidade pelos filhos, assim como as razões para não revelá-la espontaneamente. Entre os medos, destacam-se o da rejeição, o de impingir sofrimento aos filhos e prejudicar sua auto-estima e o das mudanças que a relação entre os dois poderá sofrer após a revelação.
Quanto às razões para não revelar aos filhos a homossexualidade, elas envolvem a discriminação social que os filhos poderão sofrer, a perda de direitos legais sobre eles e a ausência de uma estrutura de apoio legal e emocional para lidar com a situação.
Pais que por não conseguirem superar esses medos e enfrentar tais dificuldades mantêm sua identidade homossexual escondida tendem a ser mais distantes emocionalmente dos filhos, mais indulgentes com eles e menos seguros na relação.
Por outro lado, as razões para se assumir estão comumente associadas a valores pessoais de integridade e honestidade, ao desejo de compartilhar com os filhos uma parte significativa de sua vida e ao temor de que estes venham a descobrir por terceiros. Via de regra, pais que manifestam aos filhos sua homossexualidade costumam fazê-lo como uma etapa avançada do desenvolvimento da identidade homossexual positiva, quando alguns medos e os sentimentos de vergonha e culpa foram, pelo menos parcialmente, superados.
Pesquisas e evidências clínicas mostram que quanto mais cedo se assume, melhor são as perspectivas para o desenvolvimento de uma relação de aceitação e de confiança, e maior o preparo de pais e filhos para lidar com as dificuldades sociais decorrentes da situação. Além disso, na maior parte das vezes, depois de superados os conflitos iniciais, a relação tende a se tornar mais próxima, mais íntima e mais forte.
Texto publicado no site G Online. Seção Saindo do Armário. Ano 2003.